Por Marcos Hirai

Com a pandemia e os brasileiros dentro de casa, alguns segmentos foram muito beneficiados e tiveram seu “boom” de vendas justamente durante este período de reclusão social. Que o e-commerce, o streaming, os videogames, as vendas de medicamentos e de itens de supermercados e o delivery de comida explodiram no ano passado todos já sabem – e isso foi amplamente divulgado. Mas o fato de as famílias brasileiras ficarem reclusas também acabou incorporando novos hábitos e impulsionando o mercado de alguns produtos e serviços, beneficiando determinados varejistas.

Afinal, ficar em casa, sem poder seguir a rotina habitual, não tem sido tarefa fácil, causando nas pessoas sintomas de estresse, ansiedade e depressão. Uma forma de lidar com esses impactos tem sido realizar atividades que causem relaxamento e ajudem a mente a descansar. Veja quem está surfando nesta onda:

Um dos mais beneficiados foi o mercado de vinhos, que apresentou alta recorde de 31% em 2020. Ao todo, foram 501,1 milhões de litros comercializados no ano passado, contra 383,9 milhões de litros em 2019. O ano da pandemia entra para a História como aquele no qual mais se consumiu a bebida no País.

Para se ter uma ideia, diariamente se vende, em diferentes canais de vendas, cerca de 2 milhões de garrafas, entre brancos, tintos, rosés e espumantes. A maior rede de lojas físicas especializada em vinhos, a Grand Cru, conta com 92 unidades atualmente e abriu 15 novas lojas em 2020. O plano é agressivo para 2021: abrir entre 35 e 40 novos pontos de venda, todos franqueados.

Nesta linha, com mais tempo em casa, a busca por floricultura como hobby também aumentou. Criar um “cantinho verde” em casa nunca foi tão desejado. A pandemia aumentou a preocupação em relação à biofilia (harmonização das plantas com os espaços).

Cultivar plantas no home office contribui para a redução do nível de estresse e para o aumento do nível de concentração, além de provocar um bem-estar emocional e de melhorar a qualidade do ar e de trazer mais energia ao ambiente. Sem contar que torna os espaços mais aconchegantes.

A venda de plantas ornamentais e flores subiu 20% em 2020, de acordo com dados do Instituto Brasileiro de Floricultura (Ibraflor) e o setor espera um crescimento de 5% para 2021. Com a adesão cada vez maior de empresas ao home office permanente, este número tem tudo para ser ainda maior.

Nesta mesma direção, outro mercado beneficiado é o pet, que cresceu 13,5% em 2020, com faturamento registrado de R$ 40,1 bilhões. A previsão antes da pandemia era de alta de 6,25%. Chama atenção um levantamento feito pela plataforma Guiabolso mostrando que os brasileiros gastaram quase 10% mais com essa categoria na comparação com 2019. Ter um pet em casa ajuda a preservar a saúde mental e a reduzir o sentimento de solidão. Também deixa a casa mais alegre e, assim, ajuda as pessoas a lidarem melhor com o isolamento social.

Uma característica que chama atenção é que os brasileiros que incorporaram ao menos um animal em casa fazem parte da classe média alta, que é o perfil de quem conseguiu fazer isolamento. Em contraponto, nas classes mais baixas observou-se muito abandono de animais.

As duas maiores varejistas do setor, Petz e Cobasi, disputam acirradamente a liderança deste mercado. A Cobasi conta com um total de 100 lojas em dez Estados, cinco delas inauguradas em 2020. O faturamento em 2019 foi de R$ 1,3 bilhão e no ano passado cresceu 17%.

Já a Petz, que é a maior em número de lojas, com 106 unidades em 13 Estados, viu seu lucro mais do que dobrar em 2020 em comparação com o ano anterior. Em setembro, entrou na B3, a bolsa de valores brasileira, com uma oferta pública inicial (IPO) que movimentou R$ 3 bilhões.

Correndo por fora, a rede de franquias norte-americana Petland também tem apresentado números vistosos: presente em 17 Estados com 100 lojas e um faturamento que cresce 2 dígitos todos os anos: registrou R$ 140 milhões em 2020, com aumento de 30% nas vendas. Todas elas prometem abrir novas lojas ao longo deste ano.

Para finalizar, o segmento de produtos para o lar, móveis e decoração também apresentou crescimento expressivo. O confinamento e o home office fizeram as pessoas terem um novo olhar para o local onde moram – o seu lar. As pessoas subitamente passaram a notar que itens da sua casa estavam envelhecidos, quebrados ou simplesmente que não tinham alguns mimos domésticos.

Durante este período, descobriram-se novas necessidades, cômodos subaproveitados e ambientes que careciam de mais conforto. Isto desencadeou uma nova frente de necessidades latentes até então, o que motivou a decisão pela realização de pequenas reformas no interior das suas casas e apartamentos.

Os números de alguns segmentos voltados para o lar corroboram com esta tese. Segundo pesquisa realizada pela Abcasa, em 2020, 21% construíram ou reformaram algum cômodo na sua residência e 41% dos pesquisados disseram que investiram em ao menos algum artigo para decoração. Destes, 44% dos consumidores disseram que compraram algum item de utilidades domésticas, outros 37% disseram que compraram produtos de cama, mesa e banho, enquanto 19% adquiriram artigos decorativos para o lar. No geral, 57% compraram algum artigo para casa no ano passado.

Duas gigantes do varejo de moda têm aumentado investimentos no segmento “casa”: a Riachuelo, por meio da Casa Riachuelo, e a Renner, com as lojas da Camicado. Após um reposicionamento da marca em 2019, a Casa Riachuelo fortaleceu sua identidade e hoje está presente em 310 lojas pelo País, com store in store nos seus magazines e também por meio de lojas independentes. Em 2020, a empresa inaugurou cinco novas unidades e a expectativa é da abertura de oito em 2021. Já a Camicado tem um plano de abertura de cinco a dez novas lojas.

Os exemplos acima mostram que, na contramão de diversos setores que sofreram com a pandemia do coronavírus, alguns foram amplamente beneficiados. São produtos que podem manter o fôlego de crescimento por terem sido incorporados nos novos hábitos de consumo dos brasileiros. Num momento que se fala em crise do varejo, nem todos podem reclamar. Pelo contrário.

Marcos Hirai é CEO da Omnibox, startup especializada em Varejo Autônomo.

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