Por Fernando Rheingantz
Diretor de lojas da Vivo e cofundador da Certus Retail
Quero começar a parte de tendências falando do core da existência de uma empresa varejista, ou então das lojas de uma empresa que tenha o varejo como um de seus canais.
Varejo é um negócio de pessoas, feito por pessoas e para pessoas.
É fundamental entendermos isso, pois, em um mundo no qual a tecnologia avança de forma exponencial, é fácil pensarmos que estamos prestes a ver a substituição do ser humano no mercado de trabalho.
Penso um pouco diferente, acreditando que a tecnologia substituirá atividades nas quais o ser humano não é essencial, deixando a parte mais importante da relação e da experiência para pessoas feitas de carne e osso.
As marcas precisam contar seu propósito, criar relações de longo prazo, se relacionar, dialogar… E quem fará isso somos nós, apesar de muitas vezes contarmos com a ajuda (muito bem-vinda) das máquinas para fazermos isso cada vez melhor.
Chamo esse conceito de human-to-human. Mas não basta apenas colocar gente. Precisa de gente boa, bem treinada, que goste de gente, que represente a marca, que crie relevância. Ou, então, realmente é melhor deixar o trabalho para as máquinas.
Isso gera a necessidade nas empresas de avaliarem seu investimento em pessoas de outra perspectiva, quase como se fosse um CAPEX e não um OPEX, tratando o time como seu principal ativo, que precisa ser renovado, mantido, cuidado.
Só é possível ter uma equipe de primeira linha investindo fortemente em todo o ciclo de vida do colaborador: atração, seleção, integração, desenvolvimento, avaliação, comunicação, crescimento e até mesmo no desligamento.
Por último, as lojas precisam cada vez mais ser uma representatividade real das políticas de diversidade e inclusão das marcas, tendo nas suas equipes gente que represente, na prática, os diferentes públicos existentes na sociedade.
Como varejistas podem se beneficiar das tecnologias
Um segundo fator altamente relevante é a capacidade dos varejistas em usarem e abusarem de tecnologias, conjuntamente ou isoladamente, tais como:
- Inteligência Artificial para ajudar na sugestão de compra ou apenas para auxiliar ao longo da jornada do cliente;
- Realidade Aumentada e Virtual para melhorar a experiência e degustação , elevando a capacidade de demonstração que uma loja física pode ter;
- Robótica para automatizar processos que não necessitem de interface humana;
- Beacons para ajudar na geração (e gestão) de fluxo e identificação de “hot zones”;
- Reconhecimento Facial para identificação dos consumidores em tempo real e maior segurança das transações;
- Novos Meios de Pagamento por proximidade que facilitam o check out, dentre tantas outras alternativas atualmente disponíveis para melhorar o que as lojas podem oferecer.
Importante: não se trata apenas de usar a tecnologia. É necessário deixar a tecnologia humanizada, fazendo com que ela seja útil para o cliente, que deve perceber o valor que ela pode oferecer na sua experiência com a marca.
E, como mencionado anteriormente, a tecnologia deve estar a favor dos seres humanos, em especial dos clientes, criando relevância e ajudando na forma como as marcas e seus funcionários interagem com eles.
Além do uso da tecnologia humanizada, ou então complementando essa estratégia, é fundamental que os varejistas entendam e usem a combinação dos mundos físicos e virtuais a seu favor.
Muitas vezes, acreditamos que os fatos do “mundo digital” não têm a mesma relevância e importância daqueles do “mundo físico”, porém a verdade é que hoje os dois se misturam e formam o mundo como ele é.
Não existe mais a distinção entre um e o outro, e sim a complementação de ambos para vivermos tudo aquilo que a vida pode nos oferecer. E, em uma loja, isso não deve ser diferente, com as marcas usando e abusando da tecnologia e do ser humano para fazer com que a experiência do cliente seja a melhor possível, alavancando cada ponto de contato com a forma mais inteligente e produtiva.
Um ótimo exemplo de como fazer isso é o que marcas de moda, ou então as lojas de decoração, têm feito, mesclando realidade aumentada na degustação de produtos dos clientes dentro de suas lojas, aumentando consideravelmente as chances de compra por mostrar de forma interativa como o cliente ficará com uma roupa ou óculos não disponíveis, ou, então, como um sofá ficará na sala de estar da casa nova.
A Amazon Books, onde a precificação dos produtos é baseada no dinâmico preço online que a marca oferece, também é um exemplo. Esse entendimento de uma realidade única chama-se hiper-realidade.
Uma outra tendência que considero extremamente relevante é a do retailnment, que trata da mistura das experiências de compras com entretenimento, diversão e aprendizado.
O consumidor moderno espera muito mais de uma loja do que apenas um ponto de venda, buscando atualmente pontos de experiência, de convivência, de relacionamento, que ofereçam jornadas divertidas, interativas e únicas.
As lojas precisam se transformar para aumentarem sua relevância na vida das pessoas e justifica que eles se desloquem até lá, pois pensando apenas do ponto de vista da comodidade a escolha claramente ficará com o mundo online. E aqui não se trata de uma disputa entre os canais, até porque sou defensor da total integração entre ambos, e sim da capacidade de oferecer nas lojas físicas algo que o mundo online (ainda) não consegue.
E, ao fazer isso, a marca fica mais forte, com relacionamentos mais profundos e duradouros, e com clientes mais fiéis e que voltam mais vezes.
Todos sabemos da dificuldade com que os varejistas vêm enfrentando os desafios de gerar fluxo nas lojas, e, através do entretenimento, várias marcas vêm fazendo com que esse cenário mude. Como o desafio é fazer com que o fluxo seja por vontade e não apenas por necessidade, essa estratégia ajuda a fazer com que os consumidores se desloquem por algo que vai além da mera compra.
Complementando a estratégia acima aparece uma forte demanda pela criação de produtos e serviços únicos, feitos para cada cliente de acordo com a sua necessidade ou vontade. É quase uma volta aos séculos passados onde a criação dos produtos era feita manualmente e artesanalmente, porém, agora, com escala.
E, para que essa customização e personalização sejam viáveis, é fundamental muita tecnologia em processos produtivos para permitir que itens de série sejam fabricados de forma massiva, mas com a capacidade de fazer pequenas alterações que tornem os produtos únicos, de acordo com o gosto do freguês.
Parece difícil, e de fato é, mas já é viável com o uso de inteligência, criatividade e, como falado antes, tecnologia. Impressoras 3D, por exemplo, geram o potencial de ir ainda mais além e fazer algo realmente individualizado. Mas processos mais simples permitem que óculos, tênis, roupas, entre tantos outros, sejam feitos em uma linha produtiva e com pequenas adaptações que façam o produto parecer único.
Pensando na conveniência, uma realidade muito importante nos dias de hoje é o de oferecer tudo o que o cliente precisa em um mesmo lugar. Por tudo não quero dizer tudo de uma forma infinita (ou por que não?), mas sim tudo o que aquela marca se propõe a ter e oferecer.
Parece um paradigma em especial para marcas com amplos portfolios e SKUs variados, porém é possível unindo os estoques físicos dos virtuais e oferecendo uma jornada integrada entre os meios físicos e online. Mas o one stop shop(tudo em um só lugar) vai muito além disso, oferecendo aos consumidores o potencial de resolver tudo o que precisam visitando a loja de sua escolha (que pode, inclusive, ser a online), como compras, trocas, atendimento, pós vendas, experiências, degustações, ou qualquer que seja a sua necessidade, sem ter que retornar ou procurar outro canal.
Como o omnichannel trabalha para integrar os canais da empresa
Por último e complementando todas as estratégias acima está o tão falado omnichannel, integrando de forma real e completa todos os canais da empresa para que o cliente tenha uma experiência única independentemente do canal escolhido.
Na verdade, trata-se de colocar o cliente como o centro da estratégia, operação e sistemas da marca para que não exista distinção de processos, experiências e atendimentos entre os canais.
Muita gente confunde omnichannel com a oferta de soluções como pick up in store, prateleira infinita, reserve no site e retire na loja, ship from store, showrooming, etc., mas, na verdade, essas soluções são apenas uma parte de uma jornada realmente única.
O conceito da omnicanalidade vai muito além e faz com que as marcas tratem toda a jornada de relacionamento com o cliente de forma integrada, eliminando processos ineficientes e aproveitando todos os pontos de contato para dar sequência ao diálogo, que como falado no meu último artigo, deve ser permanente e duradouro.
E a sua empresa, como está se preparando para atender o atual consumidor?