Por Marcos Hirai
A recente carta aberta publicada pelo CEO do Magazine Luiza, Frederico Trajano, sobre a criação de um programa de trainees só para negros acabou previsivelmente repercutindo de forma barulhenta na internet e houve forte reação nas mídias sociais aflorando paixões e gerando calorosos debates acerca da legalidade, constitucionalidade e mesmo da sua oportunidade. Na sua visão, hoje há um claro desequilíbrio entre o número de funcionários e o de lideranças negras dentro da empresa.
“Claramente, se temos 53% da equipe negra e parda e só 16% de negros e pardos em cargos de liderança, há um problema para resolver com uma ação concreta.” Por isso, Frederico, junto com o conselho presidido por Luiza Trajano, olharam os números e lançaram a iniciativa para reparação. Constataram que, de 40 mil funcionários, a metade é de pessoas negras, mas estes estão fora dos cargos de liderança, representando apenas 16% dos líderes da empresa. No comitê executivo e no conselho administrativo, não há representação negra. Nos últimos anos, o programa de trainee do Magalu formou apenas dez negros entre as 250 lideranças que passaram pelo processo.
A pauta racial no Brasil ainda é assunto muito polêmico e controverso dentro das empresas. Mas o fato de essa iniciativa inédita ter partido diretamente do seu CEO, sendo o Magazine Luiza o que é, e considerando sua representatividade e seu porte, acende holofotes sobre o tema. O ano de 2020 certamente será lembrado pela pandemia do coronavírus e pelo movimento antirracista Black Lives Matter (em português: “Vidas Negras Importam”). Este assunto, portanto, se mostra mais atual e urgente possível.
Frederico Trajano faz parte da terceira geração da família que fundou o Magazine Luiza e, desde que assumiu a presidência, em janeiro de 2016, fez o valor de mercado da companhia crescer incríveis 183 vezes, consolidando a empresa como a maior varejista de bens duráveis e vendas online e uma das maiores do País. Com o avanço do mercado eletrônico durante a pandemia, o Magalu cresceu por estar há anos investindo na transformação digital interna e de sua cadeia produtiva. Cresceu mais de 50% no primeiro semestre deste ano.
Em apoio à iniciativa do Magalu, de maneira inédita e histórica no Brasil, e talvez no mundo, 73 das maiores e mais expressivas empresas e instituições do País saíram publicamente em sua defesa em anúncio no jornal Folha de S.Paulo, destacando e enfatizando que, além de inovador, o programa de trainees para negros cumpre o objetivo de combater o estado de apartheid racial corporativo nos postos gerenciais e executivos das empresas nacionais e multinacionais, além de constituir num gesto de apreço e consideração aos negros brasileiros, e um esforço republicano de fortalecimento da democracia, de combate às desigualdades e, sobretudo, de valorização da dignidade humana.
Por tudo isto, é hora de começarmos uma reflexão séria sobre esse tema, essencial nas empresas nos nossos dias atuais. A decisão corajosa do Magalu é digna de uma empresa que tem credenciais para promover discussões como esta. Ela é, sem dúvida nenhuma, a referência positiva para muitos empresários brasileiros em assuntos tão diversos como gestão, sucessão, pioneirismo, governança, valores, gestão de pessoas, transformação digital, interiorização, expansão, fusões e aquisições, turnaround e inovação, e certamente agora também será lembrada como a empresa referência em inclusão racial. O Brasil agradece.